Viagem vertical

Abriu os olhos e admirou o ventilador de teto que havia instalado na noite anterior, depois de ler cuidadosamente o manual. Ficou tão exausto com o serviço que acabou dormindo na sala. Enquanto bocejava, um automóvel deixou sua cozinha vagarosamente para não chamar a atenção e acelerou em seguida, arrebentando a porta da frente e ganhando a estrada. Pulou do sofá e saiu correndo atrás daquele automóvel insolente. Abriu as asas e pegou vôo, mas o veículo continuou ganhando distância e conseguiu envolvê-lo em uma nuvem de poeira que só se dissipou a tempo de evitar que ele se estilhaçasse contra uma floresta de enormes edifícios, tão próximos que mal podia bater suas asas entre eles e precisou fazer acrobacias. Não conseguiu desviar de um dos edifícios e passou por uma janela aberta, caindo em uma emboscada. Com dardos tranquilizantes, um grupo de vinte caçadores tentava capturá-lo. Com agilidade conseguiu penetrar na selva e despistá-los. Lá embaixo admirou uma manada de gnus, provavelmente alheios a sua presença. Sentia um forte cheiro de atum e então mergulhou pelo penhasco abaixo em queda livre, sempre de olho no mar, até que pousou na areia da praia, que o envolveu, tragando seu corpo e o jogando no meio de um movimentado calçadão, com uma pasta de executivo na mão, terno e gravata, óculos escuros. Olhou para o relógio, estava vinte minutos atrasado.

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *

Skip to toolbar