O ato de escrever

Ah… se houvesse o que escrever aqui!Talvez, se eu entendesse um pouco mais sobre o funcionamento do cérebro, pudesse escrever de forma um pouco mais convincente sobre o tema, digo, sobre o ato da escrita, este processo que começa de um pensamento naufragando e termina em uma página com caracteres martelados, rasurados ou impressos. Posso recorrer a alguns bons livros, ficar alguns dias pesquisando e no final ter conhecimento suficiente para escrever sobre o assunto. Assim faz qualquer escritor profissional que quer escrever sobre um tema desconhecido para ele. Se a estória é sobre um assalto à banco o escritor recorre à literatura policial, aos relatórios policiais de casos específicos, procura também os construtores de cofres bancários e talvez neste estágio ele descubra tanto sobre o funcionamento de um cofre que resolva roubar um banco e não mais escrever um livro, que provavelmente será um fracasso. As pessoas não têm mais paciência para ler livros grandes e maçantes como este escritor quer escrever. Então ele (você) viaja para o Nepal, onde um dos seus melhores amigos se isolou há dez anos. Troca algumas idéias com ele e o convence sobre essa maravilhosa idéia de roubar um banco. Mostra para ele as plantas, explica o funcionamento do relógio do cofre, programado para desarmar em uma hora especifica do dia. Vocês viajam e no aeroporto de Bombaim, em uma pausa para fazer a ponte aérea, você resolve comprar alguns amendoins, enquanto seu amigo fica cuidando das bagagens de mão. Quando você retorna, tanto seu amigo como suas bagagens não estão mais no local onde você havia deixado. Você não acredita mais que seja seguro deixar seus textos guardados na memória do computador, pensa isto após de ter digitado o último ponto depois de “deixado”. Você vai até a janela, acende um cigarro e olha para os garotos catando comida no lixo, depois se vira e olha para seu notebook ainda ligado com as últimas palavras em Garamond peso 12. Salva o texto, desliga o editor de textos e fecha o computador. Liga ele novamente, abre o editor de texto e salva em um disquete suas últimas palavras. Desliga o editor de textos, fecha o computador e vai ao banheiro. Olha novamente para sua cara no espelho, visão lateral com o canto dos olhos dessa vez. Você tem duas opções agora, pois o computador está desligado e você não pode mais escrever. Você pode descer até a recepção e ler alguns jornais, ou pode fazer algumas ligações e descobrir quem realmente é em que parte do planeta está hospedado. Esta última alternativa é mais complicada, mas você resolve arriscar. Pega o telefone e fica olhando para as teclas, tentando pensar em um número convincente: disca com maestria. Do outro lado da linha o telefone toca uma, duas, três, quatro vezes e então alguém atende: “Hello, no one is available to take your call, please leave your message after the tone”.Você desliga e não consegue pensar em nenhum outro número convincente. Resolve descer até a recepção para ler alguns jornais.

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